A máquina do tempo que o tempo tem – Por Arth

14/05/2025

Montagem Teatral: O tempo que o tempo tem

Montagem: De Aníbal Pacha - Coletivo Animadores de Caixa 

Arth[1]

Mais um dia normal indo para a Escola de Teatro e Dança da UFPA... quer dizer, nenhum dia é normal indo para a ETDUFPA. Mas, lá estava eu chegando com meia hora de antecedência para mais um dia de minicurso, o minicurso "Crítica teatral e semiótica: estudos introdutórios" ministrado pelo Prof.º Edson Fernando. O professor havia solicitado que no dia 29 de abril chegássemos, pontualmente, às 15h. Eu chego, encho minha garrafinha de água e me direciono para uma das salas dos altos da Escola, mais os meus colegas. O suspense paira pelo ar. Quanto menos esperávamos, fomos chamados para sair da sala. "Meu Deus, o que será que vamos assistir?" Mesmo sem saber sobre o que se tratava, era garantido que alguma coisa iriamos assistir.

Pois bem, na varanda, próximo à entrada que dá acesso a escadaria, com quem a gente se depara? Com o Prof.º Aníbal Pacha com uma grande caixa ao seu lado. Formou-se uma fila. Eu estava lá paciente, a segunda pessoa da fila, esperando ansiosamente a minha vez. No primeiro momento – mesmo essa, talvez, não sendo a sua intenção – não vi personagem, apenas vi Aníbal, o professor, com a caixa ao seu lado. A imagem da caixa me remeteu a um assunto que estava fresquinho na memória, do dia anterior: uma Inteligência Artificial (IA) do futuro que olha constantemente para o passado com vontade de punir todas as pessoas que não colaboram para a sua existência, chamada Basilisco de Roko[2]. Acredito que por conta da caixa me parecer, na primeira impressão, uma máquina do tempo. Mas, no decorrer da experiência, fui compreendendo que a relação com o tempo promovida por ela seria outra.

Chegou minha vez! Fui ter com Aníbal e a primeira coisa que me pede para fazer é escutar um pouco do som que projetava uma voz grave – parte que me foi introduzido o conceito de rádio à caixa – Ele me explica rapidamente sobre como a rádio já foi importante para as pessoas um dia. Me falou de uma época na qual as pessoas, querendo ou não, compartilhavam suas mensagens pessoais de forma pública, pois não existia o chat criptografado da nossa época. Em outra época a rádio foi o local onde se lia ao vivo mensagens pessoais – de relance eu consegui ouvir a notícia de que alguém estava dando a notícia para outro alguém de que alguém havia morrido – Em seguida, ele eleva a sua mão e retira a tampa de um buraco na parte da frente da caixa e pede para olhar.

Olhando para dentro, muitas informações, não consigo descrever todas, mas as mais marcantes que consegui registrar com o olhar foram: as pedras brancas empilhadas criando uma coluna que sustentava uma cama, tinha um senhorzinho negro sentado sobre a cama, ele não tinha a banda do chinelo direito – parece que um chinelo azul estava perdido – o pé descalço balança, na quina da cama um penico pendurado, ao lado do senhorzinho um aparelho de rádio. O que de fato me chamou mais atenção foi o movimento do senhorzinho, levando seu tronco para frente e para trás, como se estivesse me cumprimentando com reverência. Eu fiquei feliz. Mas a ansiedade de ceder a vez para outro colega e darmos continuidade as outras camadas do nosso encontro daquele dia me fizeram cessar, mas, por mais breve que tenha sido o nosso contato, consegui criar uma relação com aquele senhorzinho.

Depois que eu terminei de olhar, Aníbal, o animador, disse: "Era assim como esse senhor estava quando estava ouvindo rádio" e perguntou se eu não queria deixar uma mensagem me entregando um papel e uma caneta. Eu escrevi para uma amiga/irmã que está morando em outro estado, que eu estava com saudades dela. Enquanto, ele desenvolvia a experiência com outra pessoa, me pediu para depositar a mensagem por uma fenda na parte superior da caixa. Voltando para a sala, pude retomar o olhar por fora e reconhecer que de fato ela lembra um grande aparelho de rádio antigo, mas ainda assim, para mim, continuou sendo uma verdadeira máquina do tempo.

14 de maio de 2025

[1] Ator/Atriz-criadora de dramaturgias pretas e amazônidas e poeta da poesia falada: slam poesia. É arte-educadora no Instituto Bienal das Amazônias (BDAS). Formada em Letras - Língua Portuguesa, pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e no curso Técnico em Teatro, pela Escola de Teatro e Dança da UFPA (ETDUFPA). Cursa Especialização em Arte, pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e é graduanda em Licenciatura em Teatro, na UFPA; participante do minicurso "Crítica teatral e semiótica: estudos introdutórios" realizado pelo projeto TRIBUNA DO CRETINO;

[2] Proposta teórica surgida em 2010 em fóruns de discussão sobre inteligência artificial, que explora um paradoxo envolvendo tempo e responsabilidade moral. A hipótese sugere que uma superinteligência futura poderia, hipoteticamente, buscar punir retroativamente aqueles que, no presente, não contribuíram para sua criação. Trata-se de uma especulação que tensiona conceitos de causalidade retroativa, ética computacional e as implicações temporais do desenvolvimento tecnológico.

Ficha Técnica:

O Tempo que o tempo tem

Concepção, Suporte e Atuação:

Aníbal Pacha

Voz em Off:

Marton Maues 

Edição de trilha:

Stúdio Solar dos Silva

Realização:

Coletivo de Animadores de Caixa

Apoio Cultural:

Ateliê 705 – Casa de Bonecaria