Ausência e Metalinguagem – Por Raphael Andrade

09/09/2018

Montagem Teatral: Eros - Gênesis do Amor e da Ausência

Prêmio Seiva de Produção e Difusão Artística 2018

Raphael Andrade[1]

O edital Seiva contemplou o espetáculo Eros - Gênesis do Amor e da Ausência, com o prêmio Produção e Difusão Artística 2018, montagem teatral apresentada em uma das salas da Casa das Artes. A referida peça tem como indutor o mito do andrógino no que tange a visão da obra O Banquete, do filósofo grego, Platão. Me refiro à visão deste filósofo, porque Eros é um mito de multifárias versões na mitologia grega.

Em cena, pudemos constatar alguns pontos que empobreceram a exposição poética aprazível de tal mito andrógino, mormente sobre a metalinguagem do narrador explicar o que aconteceria em seguida na cena e os atuantes realizarem a ação corpórea que o mesmo acabara de explicitar. Como diria Sófocles: "- Faltou peripécia!"

Interessante destacar, neste enredo, a ousadia de um texto não textocêntrico no sentido dos atuantes não usufruírem do mesmo para construir um diálogo. Todavia, ao retirar esse importante suporte da cena, os olhos realçam a presença física do atuante, especialmente quando já se sabe a ação que os mesmos iriam engendrar. Na corporeidade dos dois atores e duas atrizes em cena também havia metalinguagem, pois, além de utilizar o próprio código indutor do narrador para explicar a ação, o mesmo exemplo se dá no jogo cênico, onde havia intercalação da mesma corporeidade no fluxo dos atuantes, como se houvesse um espelho entre eles e os mesmos imitassem, cada um na sua vez, o que o outro acabara de apresentar. Obviamente essa era a proposta do espetáculo, porém a repetição se tornava enfastiante. Sem referir que às vezes uma dupla posicionava-se à frente da outra, impedindo a visão dos espectadores, isto é, não tinham noção do espaço cênico.

A produção cenográfica era recatada, com um único elemento cênico que me remeteu a um portal que adentravam e saiam as "quimeras mitológicas" e quase sugestionando uma edificação em construção. O que fez lumiar as retinas é o ótimo trabalho de iluminação, com luzes que variavam e salientavam o ambiente mais que os semblantes dos atuantes que, por sinal, não externavam verossimilhança quando queriam expressar dor ou desespero, além do visagismo não colaborar neste enfoque. Sem contar com a sonoplastia caracterizada por sons triviais.

Alguns raros episódios saltaram os olhos, mormente nos momentos de melancólica poética existencial, no confronto entre segregação, ausência e reinclusão do lado quimérico-mitológico que fora extirpado. A cena do desnudamento da pele e da dor da perda da mesma, efetuou um raro brilho singular. Além das representações visuais marcadas por imagens belas como, por exemplo, as projeções que saíram do senso comum em mostrar uma visualidade diferenciada sobre a gênesis do mito.

No mais, a dramaturgia singular na ideia, fora apunhalada pela sua própria inovação, onde se perpetuou várias ausências e abundantes metalinguagens. O que permanece, e que deve ser respeitado e ovacionado na concepção do espetáculo, é a potencialidade de querer externar e ratificar a prevalência do amor que necessitamos - amor este, válido em todas as suas dimensões.

08 de setembro de 2018.


[1] Ator, Performer e graduando em licenciatura em Teatro pela UFPA.

Ficha Técnica:

Montagem Teatral:

Eros - Gênesis do Amor e da Ausência

Prêmio Seiva de Produção e Difusão Artística 2018

Dramaturgia, Direção e Elenco:

Patrícia Grigoletto, Igor Moura, Rita Ribeiro e Rick Brandão.

Produção:

Lee D'Vasconcelos e Igor Moura.

Preparação Corporal:

Renan Delmontt.

Preparação Vocal:

Isabel Ventura.

Coreógrafo:

Natan Magno.

Cenografia, Figurino, Maquiagem e Design Gráfico:

Wan Aleixo.

Direção de Audiovisual:

Allyster Fagundes.

Iluminação:

Malú Rabelo.

Sonoplastia, Assessoria de Comunicação e Social Mídia:

Luana Oliveira.

Contra-Regragem:

Rafael Cunha

Fotografia:

GM-Fotografia