Há um atalho. Há um desvio – Por Mário Zumba

18/09/2018

Montagem Teatral: Dinossauros.

Montagem: Companhia Teatral Nós Outros 

Mário Zumba[1]

Vivemos uma enorme divisão ideológica no país. A polarização radical é a tônica que orienta a vida da quase totalidade da nação brasileira. Tal cenário de antagonismo, tensão e violência acaba gerando grandes incertezas e um profundo temor naquilo que pode advir como resultado dessa dicotomia. A tensão social em torno dos acontecimentos políticos se reflete na vida das pessoas comuns provocando efeitos maléficos em suas vidas pessoais, nos seus ambientes de trabalho, suas relações sociais e privadas. O simples fato de expressar sua opinião sobre qualquer assunto, seja ele de cunho político, racial, religioso, esportivo ou de gênero, pode condenar uma pessoa a sofrer sérias consequências nas suas relações familiares, de amizade e, até, profissionais, por externar seu posicionamento dentro do antagonismo vigente. Nesse contexto não há lugar para a moderação e o pensamento radical torna-se protagonista ao lado da feroz defesa das opiniões. O agravamento das tensões exacerba, também, a distância entre os oponentes que isolam-se em sua autossuficiência de onde não se vislumbra um atalho para a reaproximação.

Mas sempre há, e sempre haverá, um atalho para a reaproximação. DINOSSAUROS nos mostra esse atalho, esse desvio, esse encurtamento do caminho em vários aspectos: quando se dispõe ao "fazer teatral" em todo e qualquer espaço que caiba a ação; quando encontra poesia nas dificuldades individuais de suas personagens e principalmente, quando dribla as dificuldades que todos nós artistas enfrentamos para realizar nossos projetos nos dias conturbados que vivenciamos.

O que temos no Espaço das Artes de Belém é um singelo espetáculo de teatro calcado na força do texto e dos atuantes. A opção por um cenário simples - onde nada é decorativo - existem apenas um banco de praça e canteiros com flores é muito acertada e mostra-se suficiente para a encenação.

Frustrou-me um pouco o fato da vitrola não funcionar de fato. Isso teria enriquecido enormemente a concepção poética do espetáculo. Talvez minha frustração deva-se ao fato de que sou fruto de uma geração onde os adolescentes sonhavam com sua primeira vitrola com o mesmo encantamento com que os adolescentes atuais sonham com seu novo celular de última geração.

Giscele Damasceno e Hudson Andrade atuam com naturalidade e competência, e até divertem-se verdadeiramente nas cenas onde o vinho torna as personagens mais soltas e abertas a novas experiências.

A encenação de Hudson Andrade e Leonardo Cardoso é limpa e minimalista centrada principalmente na qualidade do texto e na disponibilidade dos atuantes, o que se mostra um grande acerto, pois mantém a atenção do espectador focalizada na ação o tempo inteiro.

O teatro resiste e mostra-se vivo e pulsante apesar de todas as agonias e antagonias.

Brindemos.

17 de setembro de 2018.

[1] Ator. Colaborador do projeto TRIBUNA DO CRETINO. 

Ficha Técnica:

Montagem Teatral:

Dinossauros

Dramaturgo:

Santiago Serrano 

Direção:

Hudson Andrade e Leonardo Cardoso

Elenco:

Giscele Damasceno e Hudson Andrade

Iluminação:

Leonardo Cardoso

Sonoplastia:

Nilton Cézar

Cenografia e Figurino:

Nós Outros

Fotografia:

Diego Leal

Apoio:

Método Escola de Oratória

Agradecimentos:

Espaço das Artes de Belém e Vaquinha Solidária

Produção:

Companhia Teatral Nós Outros